O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de ações diretas, declarou a inconstitucionalidade de 14 leis estaduais que autorizavam a cobrança do imposto sobre causa mortis e doação (ITCMD) sobre heranças e doações provenientes do exterior.
Como no Brasil ainda não há lei complementar que regulamente a tributação nessas circunstâncias, os estados não podem exigir o imposto, mesmo que por meio de lei própria. Por esse motivo as normas estaduais que instituem os tributos não são válidas.
Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes – relator de duas ADIs – defendeu que, em sede doutrinária, há diferença entre as competências complementar e supletiva:
“Doutrinariamente, costuma-se dividir a competência suplementar dos Estados-Membros e do Distrito Federal em duas espécies: a complementar e a supletiva. A primeira (competência complementar) dependerá de prévia existência de lei federal, a ser detalhada pelos Estados-Membros e Distrito Federal. Por sua vez, a segunda (competência supletiva) é desencadeada em face da inércia da União em editar a lei federal, quando então os Estados e o Distrito Federal, temporariamente, adquirirão competência plena, tanto para edição das normas de caráter geral, quanto para normas específicas (CF, art. 24, §§ 3º e 4º)”.
Embora tenha realizado mencionada ressalva, o ministro Alexandre de Moraes votou pela inconstitucionalidade das normas estaduais, seguindo entendimento da Corte.
Assim, ficou determinado que, não obstante exista autorização constitucional para que os entes federativos – isto é, os estados e o Distrito Federal – instituam o ITCMD (art. 155, inciso I, da CF), é preciso haver lei complementar que regule a tributação se o doador tiver domicilio ou residência no exterior ou se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior (art. 155, § 1º, inciso III, alíneas “a” e “b”, da CF).
Apesar do entendimento favorável ao contribuinte, o STF limitou os efeitos da decisão somente a partir de 20 de abril de 2021, quando foi publicado o acórdão do RE 851.108. Neste julgamento – tema 825 de repercussão geral –, a Corte já havia fixado a seguinte tese:
“É vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a edição da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional”.
Entretanto, ao modular os efeitos nas 14 ações diretas de inconstitucionalidade, o STF excetuou, tal como no tema 825, as ações judiciais pendentes de conclusão até 20 de abril de 2021, em que se discuta: “(1) a qual Estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; ou (2) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente”.
O sócio da área de Assessoria do MARCHIORI, Ricardo Freitas Corrêa, analisa o contexto e as consequências da modulação:
“Aqueles que não ingressaram com medida judicial até essa data sofrerão com a limitação de seus créditos e, somente poderão pleitear a restituição do imposto constituído após essa data.
A tese firmada pelo STF confere segurança jurídica para que os contribuintes ingressem no poder Judiciário visando a restituição do que fora indevidamente recolhido, condicionando a cobrança à prévia regulamentação por Lei Complementar Federal”.
Os acórdãos das decisões das 14 ADIs julgadas pelo STF não foram publicados ainda. No entanto, você pode conferir abaixo os números e os relatores das ações, bem como as leis questionadas e os estados que foram parte nas ADIs. As informações foram extraídas pela equipe de Conteúdo do MARCHIORI a partir das certidões de julgamento do próprio Supremo:
NÚMERO |
RELATOR |
ESTADO |
DISPOSTIVOS ESTADUAIS INCONSTITUCIONAIS |
ADI 6817 |
RICARDO LEWANDOWSKI |
PERNAMBUCO |
Art. 4°, parágrafo único, da Lei nº 13.974/2009 |
ADI 6821 |
ALEXANDRE DE MORAES |
MARANHÃO |
Art. 106, § 2º, II, da Lei nº 7.799/2002 |
ADI 6822 |
ROBERTO BARROSO |
PARAÍBA |
Art. 11, parágrafo único, da Lei nº 5.123/1989, com redação dada pela Lei nº 10.136/2013; art. 3º, I, “a”, e III, “a” e “b”; e art. 17, I e II, “c”, itens 1 e 2, do Decreto nº 33.341/2012, com redação dada pelo Decreto nº 34.711/2013 |
ADI 6824 |
ALEXANDRE DE MORAES |
RONDÔNIA |
Art. 2º-A e art. 2º-B, II e IV, da Lei 959/2000, incluídos pela Lei nº 2.228/2009 |
ADI 6825 |
EDON FACCHIN |
RIO GRANDE DO SUL |
Art. 3º, III e V, da Lei 8.821/1989 |
ADI 6827 |
ROBERTO BARROSO |
PIAUÍ |
Art. 4º, II, “b” e “d”, da Lei nº 4.261/1989, com redação dada pela Lei nº 6.043/2010 |
ADI 6829 |
RICARDO LEWANDOWSKI |
ACRE |
Art. 8º, III e IV, da Lei Complementar nº 373/2020 |
ADI 6831 |
ROBERTO BARROSO |
GOIÁS |
Art. 73, I, “a”, I-A, “b” e “c”, e II, “b”, da Lei nº 11.651/1991, com redação dada pela Lei nº 18.002/2013 |
ADI 6832 |
RICARDO LEWANDOWSKI |
ESPÍRITO SANTO |
Art. 4º, I, “a”; II, “a”, 3 e 4; e “b”, 2, da Lei nº 10.011/2013 |
ADI 6834 |
EDON FACCHIN |
CEARÁ |
Art. 2º da Lei nº 15.812/2015 |
ADI 6835 |
EDON FACCHIN |
BAHIA |
Art. 8º, II, “b”, “c” e “d”, da Lei nº 4.826/1989 |
ADI 6836 |
CÁRMEM LÚCIA |
AMAZONAS |
Art. 115, parágrafo único, I e II, da Lei Complementar nº 19/1997 |
ADI 6837 |
RICARDO LEWANDOWSKI |
AMAPÁ |
Art. 74, II, “b”, “c” e “d”, da Lei nº 400/1997 |
ADI 6839 |
CÁRMEM LÚCIA |
MINAS GERAIS |
Art. 1º, § 2º, IV, da Lei nº 14.941/2003; e art. 2º, II, “d”, do Decreto nº 43.981/2005 |